sexta-feira, 1 de junho de 2012

Falar é prata, calar é ouro!


Virou moda: agora, em qualquer situação mais delicada, a pessoa se vira e diz solenemente que não vai falar nada pois não é obrigada a produzir prova conta ela própria. E fica por isso mesmo.


Isso já se tornou rotina nas ruas das cidades brasileiras, quando a Polícia faz a fiscalização da Lei Seca. Soprar o bafômetro? Só de livre e espontânea vontade. Aí o cidadão é parado e mal consegue sair do carro de tão alcoolizado e balbucia tropeçando nas palavras que não vai soprar nada. O policial o conduz à Delegacia mas forçá-lo a se submeter ao etilômetro, nem pensar. Não pode. É a tal da prova contra si próprio.


E de onde vem isso? Ah, está na Constituição.  É a interpretação do inciso LXIII do artigo 5º da CF, que diz que “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado”.  Segundo posições doutrinárias, esse direito de permanecer calado é mais abrangente e não se restringe somente à pessoa presa.  Pronto, confusão armada.


Na verdade, esse princípio de permanecer calado vem expresso no Pacto de São José da Costa Rica, de 1969, em seu artigo 8º: “Toda pessoa acusada de um delito tem direito a que se presuma sua inocência, enquanto não for legalmente comprovada sua culpa. Durante o processo, toda pessoa tem direito, em plena igualdade, às seguintes garantias mínimas: ... g) direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem a confessar-se culpada;”.  O Pacto de São José da Costa Rica é um Tratado Internacional do qual o Brasil é signatário e disso decorre sua estrita observância por aqui, também.


É bom que se diga que essa Carta da Convenção Americana de Direitos Humanos apenas reforçou a máxima latina “nemo tenetur se detegere” – literalmente “ninguém é obrigado a se descobrir”.  O surgimento desse conceito se perde na História mas é correto afirmar que já tem alguns séculos e carrega um sentimento de auto-defesa que o ser humano possui desde sempre. 


Se pensarmos bem, qual a criança que, acusada de uma travessura, confessa? Ao que eu saiba, nenhuma... o mais comum é ouvirmos “não fui eu”. Algumas vão além e estendem o dedo acusatório: “Foi ele... ó...ó...ó...”. Crianças crescem e algumas delas seguem assim pela vida afora. 


Vários profissionais também emudecem ou se esquivam:


Médico: “Fizemos o que foi possível...
Engenheiro: “A ponte ruiu, é? Não fui eu quem fiz os cálculos...
Religioso: “A culpa não é de ninguém; Deus quis assim...
Dentista: “O problema é fadiga do material...
Advogado: “Agora é com o Juíz...


Alguns políticos ainda acrescentam “... não fui eu... eu não sabia de nada... ninguém me contou...”.


Agora, até malandro convocado em CPI do Congresso envereda por essa brecha e fica mais calado do que uma cachoeira.


Mas tudo é aprendizado. Experiência conta, concorda comigo?


Da próxima vez que eu for à Igreja e tiver que encarar o confessionário, ajoelho lá e fico bem quietinho...


Tá pensando que sou besta?!?

Um comentário:

Rosaria disse...

Perfeito ....adorei ...aliás como sempre teus textos são uma delícia de ler .... ;o)